domingo, 13 de setembro de 2009

Luke Brandon e Becky Bloom - Retrospectiva

- Rebecca. Que bom que você veio.
Olhei para ele e quase engasguei com o champanhe. É Luke Brandon, o todo-poderoso da Brandon Communications, olhando direto para mim como se soubesse exatamente o que estou pensando.
Só o encontrei poucas vezes e sempre me sinto pouco à vontade perto dele. Para começar, tem uma reputação de dar medo. Todos sempre falam de seu talento, até meu chefe Philip. Criou a Brandon Communications do nada, e agora é a maior empresa de RP financeiras de Londres. Alguns meses atrás foi citado em alguns jornais como um dos mais inteligentes empresários de sua geração. Diziam que seu QI é um fenômeno de tão alto e que tem memória fotográfica. (Sempre detestei as pessoas com memória fotográfica.)


Enquanto Alicia continua falando, me inclino em direção a Elly.
- Então ouça – murmuro. – Posso pegar seu cartão de crédito emprestado?
- Já estourei – sussurra Elly numa expressão de desculpa. – Já alcancei meu limite. Por que você acha que estou vivendo de vales?
- Mas preciso de dinheiro! – murmuro. – Estou desesperada! Preciso de vinte paus!
Falo mais alto do que o pretendido e Alicia pára de falar.
- Talvez devesse ter investido na Foreland, Rebecca – diz Alicia, e uma nova risadinha toma conta da sala. Alguns rostos voltam-se para mim e devolvo um olhar pálido. São colegas jornalistas, pelo amor de Deus. Deveriam estar do meu lado. Onde está a solidariedade entre colegas?
Não que eu tenha me filiado ao sindicato dos jornalistas. Mas mesmo assim.
- Para que você precisa de vinte libras? – diz Luke Brandon, na frente da sala.
- Eu... minha tia – digo, desafiando. – Ela está no hospital e eu queria presenteá-la.
A sala está em silêncio. Depois, para minha incredulidade, Luke Brandon leva a mão ao bolso, tira uma nota de vinte libras e entrega a um rapaz na fileira da frente de jornalistas. Ele hesita e passa para a fileira atrás dele. E assim, continuando, a nota de vinte libras é passada de mão em mão, fazendo seu caminho até mim como um fã num show de rock sendo carregado pela multidão. Quando chega em mim, uma rodada de aplausos toma conta da sala e eu enrubesço.
- Obrigada – respondo, embaraçada. – Vou pagar-lhe de volta, claro.
- Minhas recomendações para sua tia – diz Luke Brandon.


Ando vagarosamente para fora da loja, ainda com uma sensação inebriante de prazer. Tenho uma echarpe Denny and George. Tenho uma echarpe Denny and George! Tenho...
- Rebecca. – Uma voz masculina interrompe meus pensamentos. Olho e meu estômago treme de horror. É Luke Brandon.
Luke Brandon está em pé na rua, bem na minha frente, e está olhando para minha sacola. Vou ficando cada vez mais nervosa. O que ele está fazendo aqui na calçada afinal? Pessoas como ele não têm motoristas? Não deveria estar se dirigindo rapidamente a alguma recepção importante ou algo assim?
- Comprou direitinho? – diz ele, franzindo um pouco as sobrancelhas.
- O quê?
- O presente de sua tia.
- Ah, sim – respondo engolindo. – Sim, eu... eu o comprei.
- É isso? – ele aponta para a sacola, e sinto meu rosto queimar.
- Sim – digo afinal. – Achei que uma... echarpe seria bom.
- Muito generoso de sua parte. Denny and George. – Ele levanta as sobrancelhas. – Sua tia deve ser uma senhora elegante.
- Ela é – respondo e limpo a garganta. – É incrivelmente criativa e original.
- Estou certo disso – diz Luke e pára. – Qual é o nome dela?
Ah, Deus. Eu devia ter fugido logo que o vi, enquanto tinha chance. Agora estou paralisada. Não consigo pensar em um nome feminino sequer.
- Erm... Ermintrude – ouço minha voz respondendo.
- Tia Ermintrude – diz Luke pensativo. – Bem, dê-lhe minhas lembranças.
Faz um aceno com a cabeça, afasta-se, e fico observando, pensando se ele descobriu ou não.

***

Por favor, Deus, só uma vez, faça com que haja alguém que eu conheça. Não precisa ser alguém de quem eu goste, ou mesmo que eu conheça tão bem assim, só alguém a quem eu possa me juntar, papear um pouquinho e depois exclamar “Precisamos almoçar!” Qualquer pessoa serve. Qualquer um mesmo...
Nesse momento, com uma emoção inacreditável, vejo um rosto familiar a algumas mesas de distância! É Luke Brandon, sentado numa mesa com um senhor e uma senhora mais velhos, muito bem-vestidos.
(...)
- Pai, estou certo de que Rebecca não quer falar de trabalho – diz Luke, franzindo um pouco a testa.
- Com certeza! – diz a Sra. Brandon, sorrindo para mim. – É uma linda echarpe, Rebecca. É Denny and George?
- Sim! – digo alegre, aliviada por escapar da declaração do ministro. (Que declaração?) – Fiquei tão contente, comprei-a na semana passada numa liquidação!
De soslaio, consigo ver que Luke Brandon está me olhando com uma expressão estranha. Por quê? Por que me olha tão...
Ai, merda. Como posso ser tão burra?
- Na liquidação... para minha tia – continuo, tentando pensar o mais rápido possível – comprei para minha tia de presente. Mas ela... morreu.
Fez-se um silêncio constrangedor e desvio meu olhar para o chão. Não consigo acreditar no que acabei de dizer.

***

- E então – o que vai fazer agora? – pergunta ele.
Não diga “nada”. Nunca diga “nada”.
- Bem, tenho umas coisinhas para fazer – digo. – Telefonemas para dar, pessoas para ver. Esse tipo de coisa.
(...)
Chego numa esquina e estou só esperando os carros pararem para atravessar, quando um táxi pára ao meu lado.
- Sei que é uma mulher muito ocupada, com muitas coisas para fazer – vem a voz de Luke Brandon e minha cabeça levanta de repente de susto. Lá está ele, com a cabeça inclinada pela janela do táxi, seus olhos escuros franzidos num pequeno sorriso. – Mas se você tivesse uma meia hora de folga, não estaria interessada em fazer compras, estaria?
(...) Paramos do lado de fora de uma agência do Lloyds Bank. Olho inocente pela janela, para a fila de pessoas lá dentro e me ouço dizer “Sabe o quê? Os bancos deveriam ter liquidações em janeiro. Todos têm.”
Há um silêncio e quando olho vejo uma expressão de diversão no rosto de Luke.
- Os bancos? – diz ele.
- Por que não? – digo defensivamente. – Eles poderiam reduzir suas tarifas por um mês ou coisa parecida. E o mesmo poderiam fazer as empresas construtoras. Grandes cartazes nas janelas, “Preços reduzidos”...
(...)
Quando volto minha atenção para dentro do carro novamente, Luke está escrevendo algo num caderninho. Seu olhar encontra o meu por um momento, depois diz:
- Rebecca, você está falando sério em largar o jornalismo?
- Ah – digo vagamente. – Para ser sincera, tinha esquecido tudo sobre largar o jornalismo. – Eu não sei. Talvez.
- E você realmente acha que trabalhar em banco poderia ser mais adequado a você?
- Quem sabe? – digo, me sentindo um pouco atordoada com seu tom de voz. Está bom para ele. Não tem se preocupar com sua carreira pois tem sua própria empresa multimilionária. – Elly Granger está deixando o Investor’s Weekly News – acrescento. – Ela está indo trabalhar na Whetherby’s como gerente de fundos.
- Ouvi falar – diz ele. – Mas você não é nada parecida com Elly Granger.
Verdade? Este comentário me intriga. Se não sou como Elly, com quem pareço afinal? Alguém realmente legal como Kristin Scott Thomas, talvez.
- Você tem imaginação – acrescenta Luke. – Ela não.


Deus, estamos nos divertindo. Nós alinhamos oito malas numa fila e demos a elas pontos pela aparência, peso qualidade do tecido, número de bolsos no interior e eficiência das rodinhas. (Eu testo isto desfilando pela seção, puxando a mala atrás de mim. A esta altura, o vendedor já desistiu e nos deixou fazendo isso.) Depois olhamos para ver se elas têm uma mala de mão combinando e damos pontos também.
(...)
Mas então, não sou eu quem vai decidir, certo? É Luke quem estão comprando a mala. Ele é quem tem que escolher. Sentamos no chão, um do lado do outro e olhamos para elas.
- A verde seria mais prática – diz Luke finalmente.
- Mmm – eu digo sem compromisso. – Suponho que sim.
- É mais leve, e as rodinhas são melhores.
- Mmm.
- E a pele provavelmente iria arranhar numa questão de minutos. O verde é uma cor mais adequada.
- Mmm – digo, procurando parecer que concordo com ele.
Ele me dirige um olhar inquisitivo e diz:
- Certo. Bem, acho que fizemos nossa escolha, você não acha? – E, ainda sentado no chão, chama o vendedor.
- Sim senhor? – diz o vendedor, e Luke acena para ele.
- Gostaria de comprar uma dessas malas bege-claras, por favor.
- Oba! – digo eu, e não consigo parar um sorriso de alegria que inunda meu rosto. – Você está comprando a que eu mais gostei!
- Regra da vida – diz Luke, levantando-se e limpando as calças com as mãos. – Se eu me dei ao trabalho de pedir a sugestão de alguém, então devia ouvi-la.
- Mas eu não disse qual...
- Não precisou – diz Luke, estendendo a mão para me levantar do chão. – Os seus “Mmms” entregaram tudo.
Sua mão é surpreendentemente forte em torno da minha e quando ele me levanta, sinto um friozinho no estômago. Ele tem cheiro gostoso, também. Alguma loção pós-barba que não reconheço. Por um momento, nenhum de nós dois diz nada.
(...)
Luke deve precisar voltar para o escritório. Ele não pode ficar por aí fazendo compras o dia todo. E se me perguntar o que eu vou fazer depois, falo para mim mesma, realmente direi que estou ocupada. Vou fingir que tenho alguma reunião importante marcada ou algo assim.
- Tudo resolvido – diz ele voltando. – Rebecca, estou incrivelmente grato por você ter me ajudado.
- Ótimo! – digo feliz. – Bem, preciso ir...
- Por isso eu estava pensando – diz Luke, antes que eu continue. – Você quer almoçar?


- Boa escolha – diz Luke, sorrindo para mim. – E mais uma vez obrigado por me acompanhar hoje. É sempre bom ter uma segunda opinião.
- Nenhum problema – digo suavemente e tomo um gole de vinho. – Espero que aproveite bem a mala.
- Ah, não é para mim – diz ele após uma pausa. – É para Sacha.
- Ah, certo – digo amável. – Quem é Sacha? Sua irmã?
- Minha namorada – diz Luke, e vira-se para chamar um garçom.
E eu olho para ele sem conseguir me mover.
(...)
- Tudo bem? – diz Luke olhando de volta para mim.
- Não – ouço-me dizer. – Não, não está. Você não me disse que a mala era para sua namorada. Nem me disse que tinha uma namorada.
(...)
- Sinto muito – digo numa voz trêmula e me levanto. – Não tenho tempo para almoçar afinal.
- Rebecca, não seja boba! – diz Luke. – Olha, sinto muito se você não sabia sobre a minha namorada. – Ele levanta as sobrancelhas num ar questionador e eu quero bater nele. – Mas ainda podemos ser amigos, não podemos?
- Não – respondo com dificuldade, ciente de que minha voz está grossa e meus olhos estão ardendo. – Não, não podemos. Amigos se tratam com respeito. Mas você não me respeita, não é, Luke? Você só me vê como uma piada. Uma ninguém. Bem... – Engulo em seco. – Bem, eu não sou.
E, antes que ele consiga dizer alguma coisa mais, eu me viro e, rapidamente, saio do restaurante, um pouco cega de lágrimas de decepção.

***

Eles não ousarão me mandar embora, sou IMPRENSA. Na verdade, talvez eu...
- Rebecca. Que bom que você pôde vir.
Olho e sinto-me gelar. O homem vestindo o terno é Luke Brandon. Luke Brandon está de pé na minha frente, olhando direto para mim, com uma expressão que não consigo decifrar muito bem. E de repente me sinto mal. Tudo o que planejei sobre fingir ser fria e distante não vai funcionar porque só de ver seu rosto fico quente de humilhação, tudo de novo.
- Oi – murmuro olhando para baixo. Por que estou até dizendo Oi para ele?
- Eu esperava que você viesse – diz ele numa voz baixa e séria. – Eu queria muito...
- Sim – interrompo. – Bem, eu... não posso conversar, preciso circular. Estou aqui para trabalhar, você sabe.
Estou procurando parecer digna, mas há uma hesitação em minha voz, e posso sentir meu rosto ir enrubescendo enquanto ele me olha. Por isso viro antes que ele possa dizer qualquer outra coisa e me afasto na direção do outro lado da tenda.

***

- Alô, Rebecca Bloom – digo numa voz profissional.
- Rebecca – diz a voz rude de Luke Brandon, e meu coração gela. Você poderia por favor me dizer que diabos está acontecendo?
Merda.
Merda, ele parece realmente zangado. Por um momento estou paralisada. Minha garganta está seca, minha mão está suando em volta do fone. Ah, Deus. O que eu vou dizer? O que eu vou dizer a ele?
Mas espera aí. Eu não fiz nada de errado.
- Não sei do que você está falando – digo, ganhando tempo. Fique calma, digo a mim mesma. Calma e fria.
- Sua tentativa espalhafatosa no Daily World – diz ele sarcástico. – Sua historinha tendenciosa, desequilibrada, provavelmente difamatória.
Por um segundo fico tão chocada que não consigo falar. Tendenciosa? Difamatória?
- Não é tendenciosa! – digo finalmente. – É um bom artigo. E certamente não é difamatório. Posso provar tudo o que disse.
- E suponho que ouvir o outro lado da história tenha sido inconveniente – ele vocifera. – Imagino que você estava ocupada demais escrevendo sua prosa brilhante para procurar a Flagstaff Life e pedir sua versão dos fatos. Preferiu ter uma boa história do que estragá-la com uma visão equilibrada.
- Eu tentei ouvir o outro lado da história! – exclamo furiosa. – Telefonei para sua estúpida empresa de RP ontem e disse a eles que estava escrevendo o artigo!
(...)
- Rebecca – diz Luke finalmente – se isto tudo tem a ver com o que aconteceu entre nós naquele dia, se isto é alguma espécie de vingança mesquinha...
- Não se atreva a me insultar! – grito. – Não tente inventar que isto é alguma espécie de coisa pessoal, droga! Não tem nada a ver com aquilo! A incompetência da sua empresa é que deve ser responsabilizada.

***

- Em vez de uma entrevista simples, pensamos em um debate acalorada.
- Um debate acalorado? – repito, procurando não parecer tão alarmada como estou me sentindo.
- Claro! – diz Zelda. – O que queremos é realmente uma discussão apaixonada! Opiniões sendo emitidas, vozes se elevando. Esse tipo de coisa.


Não. Ah, não. De repente me sinto com frio.
- Luke! – vem a voz de Zelda do corredor, e meu estômago começa a se agitar. – Estou muito feliz por você ter podido vir. Sempre adoramos ter você no programa. Sabe, não tinha a menor idéia de que você representava a Flagstaff Life, até Sandy dizer...
No espelho, posso ver meu rosto perdendo a cor.
Isto não está acontecendo. Por favor diga-me que isto não está acontecendo.
- A jornalista que escreveu o artigo já está aqui – Zelda está dizendo – e já a informei do que está acontecendo. Acho que vai ser um excelente programa o debate entre os dois!
(...)
Lentamente giro minha cabeça quando ela passa pela porta.
Encontro os olhos graves e escuros de Luke Brandon e ele encontra os meus e, por alguns segundos mais, nós nos olhamos. Depois, repentinamente ele desvia o olhar e se distancia descendo o corredor.


Só consigo pensar no fato de que, dentro de quinze minutos, precisarei sentar num sofá e discutir altas finanças com Luke Brandon, ao vivo na televisão.
Só de pensar nisso sinto vontade de chorar. Ou de rir. Quero dizer, é como alguma espécie de brincadeira de mau gosto. Luke Brandon contra mim. Luke Brandon, com seu QI de gênio e sua maldita memória fotográfica, contra mim. Ele vai me derrotar facilmente. Vai me massacrar.


- Então, vocês dois já se conhecem? – pergunta Zelda, que vai andando entre nós.
- Sim, já nos conhecemos – diz Luke breve.
- Num contexto profissional – digo, igualmente breve. – Luke está sempre procurando promover algum produto financeiro patético. E eu estou sempre evitando seus telefonemas.
Zelda dá uma risada apreciando e vejo os olhos de Luke brilharem de raiva. Mas realmente não ligo. Não me importa o quanto ele se irrita. De fato, quanto mais irritando ele fica, melhor me sinto.
- Então, Luke, você deve ter se aborrecido bastante com o artigo de Rebecca no Daily World – diz Zelda.
- Não fiquei satisfeito – diz Luke.
- Ele me telefonou para reclamar, você acredita? – digo alegremente. – Não consegue aceitar a verdade, hein, Luke? Não quer enxergar o que há sob o brilho de RP? Sabe, talvez você devesse mudar de emprego.
Há um silêncio e me viro para ver Luke. Ele parece tão furioso que, por um terrível instante, chego a pensar que vai me bater. Depois seu rosto muda e, numa voz calma e gelada, ele diz:
- Vamos entrar logo no maldito cenário e acabar com essa farsa, está bem?
Zelda levanta as sobrancelhas para mim e eu sorrio de volta. Nunca vi Luke tão perturbado como agora.


- Talvez a Flagstaff Life não tenha desobedecido a lei. Talvez eles não tenham quebrado nenhuma regra. Mas há uma justiça natural neste mundo, e eles não só a quebraram, eles a estilhaçaram. Esses clientes mereciam aquela bonificação. Eles eram clientes leais, antigos, mereciam. E se você é honesto, Luke Brandon, sabe que eles mereciam.
Termino minha fala sem ar e olho para Luke. Ele está me fitando com uma expressão indecifrável no rosto e, sem querer, sinto meu estômago dar um nó de nervoso. Engulo, procuro afastar meu olhar do dele, mas de algum modo não consigo mexer minha cabeça. É como se nossos olhos estivessem colados um no outro.
- Luke? – diz Emma. – Você tem uma resposta para o argumento de Rebecca?
Luke não responde. Está olhando para mim, e eu para ele, sentindo meu coração pular como um coelho.
- Luke? – repete Emma levemente impaciente. – Você tem...
- Sim – diz Luke. – Sim, eu tenho. Rebecca... – Ele balança a cabeça, quase sorrindo para si mesmo, depois olha novamente para mim. – Rebecca, você está certa.
De repente faz-se um silêncio total no estúdio.
Abro minha boca, mas não consigo emitir um som sequer.
Do canto do meu olho, vejo Rory e Emma se olhando perplexos.
- Desculpe, Luke – diz Emma. – Você quer dizer...
- Ela está certa – diz Luke, e encolhe os ombros. – Rebecca está absolutamente certa. – Ele pega seu copo d’água, inclina-se no sofá e toma um gole. – Se você quer minha opinião sincera, esses clientes mereciam aquela bonificação. Eu gostaria muito que eles a tivessem recebido.
(...)
– Para dizer a verdade, eu não tinha a menor idéia de que isto estava acontecendo até ler o artigo de Rebecca no Daily World. Que, por falar nisso, foi um excelente artigo de jornalismo investigativo – ele acrescenta, acenando para mim. – Parabéns.


E de repente tudo acabou. Tudo terminado. Restamos só eu e Luke, sentados um na frente do outro, nos sofás, com as luzes ainda brilhando sobre nós e os microfones ainda presos em nossas lapelas. Estou um pouco traumatizada. Um pouco tonta.
Aquilo tudo realmente acabou de acontecer?
- Então – digo finalmente e limpo a garganta.
- Então – repete Luke, com um pequeno sorriso. – Muito bem.
- Obrigada – digo e mordo meu lábio estranhamente no silêncio.
(...)
- Você...
- Eu estava...
Nós dois falamos ao mesmo tempo.
- Não – digo, ficando vermelha. – Você fala. O meu não era... Fala você.
- Está bem – diz Luke, e encolhe o ombro. – Eu ia exatamente perguntar se você gostaria de jantar comigo esta noite.
Olho para ele surpresa.
O que ele quer dizer jantar? Ele quer dizer...
- Para discutir assuntos de trabalho – continua ele. – Gostei muito da sua idéia de fazer uma promoção de cotas de fundo fiduciário no estilo das liquidações de janeiro.
(...)
- Ah – digo, e engulo em seco, inexplicavelmente desapontada. – Ah, entendo. Bem, eu... eu acho que eu estaria livre esta noite.
- Bom – diz Luke. – Pode ser o Ritz?
- Se você gosta – digo indiferente, como seu eu fosse lá todo dia.
- Bom – diz Luke outra vez, e seus olhos apertam-se num sorriso. – Vou esperar ansioso por isto.
E depois – Ah, Deus. Para meu total horror, antes que eu possa me conter, ouço minha voz dizendo com ar sacana:
- E Sacha? Ela não tem planos para você esta noite?
Já enquanto as palavras saem, sinto-me enrubescer. Ah, merda. Para que disse isso?
Faz-se um longo silêncio durante o qual quero me esconder em algum lugar e morrer.
- Sacha se foi, uma semana atrás – diz Luke finalmente, e minha cabeça levanta.
- Ah – digo delicadamente. – Ah, meu Deus.
- Sem aviso, fez a mala e se foi. – Luke olha para mim. – Ainda assim, poderia ser pior. – Faz um gesto sem expressão. – Pelo menos eu não comprei a frasqueira também.
Ah, Deus, agora vou rir. Preciso rir. Não devo.
- Sinto muito – consigo dizer afinal.
- Eu não – diz Luke olhando para mim sério, e a risada dentro de mim morre. Olho de volta para ele nervosa e sinto meu coração começar a bater acelerado.

***

- Então – digo fitando-o, e levanto os óculos. – Ao trabalho.
- Ao trabalho – repete Luke e dá um sorriso irônico. – O pouco que ainda me resta.
- Verdade? – Olho para ele confusa e aí eu percebo. – Quero dizer, depois do que você disse no Morning Coffee? Aquilo o deixou em apuros?
Ele acena que sim e sinto uma pontada de aflição por ele.
Quero dizer, Suze está certa – Luke é bastante arrogante. Mas devo dizer que achei muito bom da parte dele levantar a cabeça daquele jeito e dizer publicamente o que realmente pensava da Flagstaff Life. E, agora, se ele vai ficar arruinado em decorrência disso, bem, parece muito injusto.
- Você perdeu tudo? – pergunto calma e Luke ri.
- Eu não iria tão longe. Mas, esta tarde, tivemos que dar muitas explicações para nossos outros clientes. – Ele fez uma careta. – Devo dizer que insultar um de seus maiores clientes ao vivo na televisão não é exatamente uma prática normal de RP.
- Bem, acho que eles deveriam respeitar você! – retruco. – Por ter dito realmente o que pensa! Quero dizer, tão poucas pessoas fazem isso hoje em dia. Podia ser como... o slogan da sua empresa: “Nós dizemos a verdade.”
Tomo um gole grande de champanhe e olho para ele em silêncio. Luke está me fitando com uma expressão estranha no rosto.
- Rebecca, você tem uma habilidade fantástica para acertar em cheio – diz ele finalmente. – Foi exatamente o que alguns de nossos clientes disseram. É como se tivéssemos nos dado um selo de integridade.
- Oh – digo satisfeita. – Então não está arruinado.
- Não estou arruinado – concorda Luke e abre um pequeno sorriso. – Apenas levemente enfraquecido.
Um garçom aparece do nada, enche minha taça e eu tomo um gole. Quando olho para Luke ele está me fitando novamente.
- Sabe, Rebecca, você é uma pessoa extremamente perspicaz – diz ele. – Enxerga o que os outros não vêem.
- Ah, bem. – Balanço minha taça de champanhe no ar. – Não ouviu Zelda? Sou a guru de finanças que encontra a vizinha. – Nossos olhos se encontram e os dois começam a rir.
- Você é instrutiva e acessível.
- Informada com os pés no chão.
- Você é inteligente, charmosa, viva... – Luke murcha, olhando para sua bebida, depois me encara.
- Rebecca, quero me desculpar – diz ele. – Estou querendo fazer isto há algum tempo. Aquele almoço no Harvey Nichols... você estava certa. Não a tratei com o respeito que merecia. O respeito que merece.
Termina a frase, faz-se um silêncio e eu abaixo o olhar para a toalha de mesa sentindo meu rosto em chamas. Está tudo muito bem para ele, dizer isto agora, penso furiosa. Está tudo muito bem para ele reservar uma mesa no Ritz e pedir champanhe e esperar que eu sorria e diga “Ah, está bem”. Mas por trás de toda brincadeira ainda me sinto ferida com aquele episódio. E, depois de meu sucesso esta manhã, estou num humor belicoso.
- Meu artigo no Daily World não teve nada a ver com aquele almoço – digo sem encará-lo. – Nada. E você ter insinuado que tinha...
- Eu sei – diz Luke e suspira. – Nunca deveria ter dito aquilo. Foi um comentário... defensivo e irritado num dia em que, francamente, você tinha nos deixado a todos em maus lençóis.
- Verdade? – Não consigo evitar um sorriso de prazer nos lábios. – Eu deixei todos em apuros?
- Está brincando? – diz Luke. – Uma página inteira no Daily World sobre um de nossos clientes, completamente sem mais nem menos?
Ah. Até que eu gosto desta idéia. A Brandon C. inteira em polvorosa por causa de Janice e Martin Webster.
- Alicia também ficou baratinada? – Não consigo resistir à pergunta.
- Claro – diz Luke secamente. – Mais ainda quando eu descobri que ela havia realmente falado com você no dia anterior.
Ah!
- Bom – ouço-me dizer infantilmente, e depois me arrepender. As grandes mulheres de negócios não exultam de satisfação maligna quando seus inimigos são repreendidos. Eu devia ter apenas feito um gesto significativo com a cabeça ou ter exclamado “Ah”.
- Então, eu deixei você baratinado também? – pergunto, fazendo um ar de indiferença.
O silêncio toma conta do ambiente e, depois de algum tempo, olho para ele. Luke está com os olhos em mim, com uma expressão séria que faz meu coração começar a bater forte.
- Você tem me deixado assim já há algum tempo, Rebecca – diz ele calmo. Mantém o olhar por uns segundos enquanto eu também estou olhando fixo para ele, incapaz de respirar – depois desvia para o menu.
- Vamos pedir?


- Certo – diz ele, como que fechando o assunto. – Bem. Talvez devêssemos chamar um táxi para você. – Sinto um baque de decepção e procuro não demonstrar. – Ou talvez... – Ele pára.
Há uma pausa interminável. Quase não consigo respirar. Talvez o quê? O quê?
- Conheço bem o pessoal aqui – diz Luke finamente. – Se quiséssemos... – Ele encontra meu olhar. – Acho que poderíamos ficar.
Sinto um choque elétrico passar pelo meu corpo.
- Você gostaria?
Incapaz de falar, aceno afirmativamente. Ah, Deus. Ah, Deus, é a coisa mais excitante que já fiz.
- Está bem, espere aqui – diz Luke. – Vou ver se consigo quartos. – Ele se levanta e eu olho para ele abismada, minha mão fria e abandonada.
Quartos. Quartos no plural. Então ele não quis dizer...
Ele não quer...
Ah, Deus. O que há de errado comigo?


- Bem – diz Luke. – É isso.
- Sim – digo numa voz que não parece minha. – Obrigada... obrigada. E pelo jantar. – Limpo minha garganta. Estava delicioso.
Parece que nos transformamos em completos estranhos.
- Bem – diz Luke novamente e olha para seu relógio. – É tarde. Você provavelmente vai querer... – Pára e faz-se um silêncio de expectativa.
Meu coração está batendo forte no meu peito, minhas mãos estão torcidas num nó nervoso. Não ouso olhar para ele.
- Já vou então – diz Luke finalmente. – Espero que você tenha uma...
- Não vá – ouço-me dizer e fico queimando de vermelha. Não vá ainda. Nós podíamos só... – Engulo. – Conversar, ou alguma coisa.
Olho para ele, encontro seu olhar e algo amedrontador começa a bater dentro de mim. Lentamente ele anda na minha direção, até ficar bem na minha frente. Consigo sentir o cheiro do perfume de sua loção pós-barba e ouvir o ruído de sua camisa de algodão quando ele se movimenta. Meu corpo inteiro está pinicando de ansiedade. Ah, Deus, quero tocá-lo. Mas não ouso. Não ouso mexer nada.
- Nós podíamos só conversar, ou alguma coisa – ele repete e lentamente levanta as mãos até envolverem meu rosto. – Nós podíamos só conversar. Ou alguma coisa.
E depois ele me beija.
Sua boca está na minha, gentilmente separando meus lábios, e sinto uma flechada incandescente de excitação. Suas mãos estão descendo pelas minhas costas e envolvendo minhas nádegas, passando os dedos sob a bainha da minha saia. Depois ele me puxa apertado para ele e, de repente, acho difícil respirar.
E está bem óbvio que não vamos conversar muito coisa nenhuma.

**********

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